Seminário realizado em Manaus expôs, a partir de pesquisas, os impactos do novo Ensino Médio nas diferentes Amazônias

A realização em Manaus do Seminário ANPEd "Ensino Médio: o que as pesquisas têm a dizer", no último dia 26 de maio, trouxe não apenas subsídios ao debate sobre o tema, mas uma ampla reflexão sobre as amazônias e juventudes brasileiras em tal contexto. Numa mesa composta por mulheres, Geovana Lunardi, presidenta da Associação, pontuou logo na abertura que uma das principais tarefas da ANPEd é "mostrar como as diferentes regiões do país produzem ciência, fazem pesquisa e têm muito o que dizer sobre as políticas educacionais. Acesse o vídeo da transmissão do seminário.

Célia Aparecida Bettiol, coordenadora do PPGE da Universidade do Estado do Amazonas (UEA), instituição que recebeu o seminário, deu as boas-vindas e destacou o desafio de uma política pública que não seja homogênea, que leve em consideração as dimensões e diferenças presentes no Brasil. "Por isso a importância da ANPEd ofertar ao Ministério da Educação subsídios que partem dessa realidade", disse. Bettiol também deu apoio aos professores da rede básica do estado, em greve por melhorias de trabalho e direitos. Fabiane Maia, vice-presidente Norte da ANPEd e mediadora da atividade, lembrou que "mais do que região Norte, somos representantes dos povos da Amazônia e que o Brasil não se colocar de costas, mas escutar a Amazônia". 

Camila Ferreira da Silva, coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), enalteceu o seminário "construído para e com os alunos do PPGE" e que, depois de tantos anos de retrocesso no MEC, todo o processo de escuta tem sido uma retomada dos espaços da Educação. Camila celebrou o fato de ter uma gestão da ANPEd que está ouvindo a Amazônia e uma associação que vai de fato ao território para tal. Em outubro deste ano, pela segunda edição consecutiva, a Reunião Nacional da entidade será realizada na Amazônia, na própria cidade de Manaus, sediada pela UFAM e UEA. A mesa ainda contou com falas de representantes da reitoria da UEA, do IFAM e da FAPEAM, agência de fomento. 

Tendo a presença do MEC como observador, além da Coordenadora Geral de Ensino Médio na Secretaria de Educação Básica, Valdirene Alves de Oliveira, o seminário deu visibilidade exatamente à pesquisa realizada na Amazônia para o que acompanhava o evento de todo o país, além de plateia local. A primeira apresentação foi de Anderson Pereira Evangelista, doutorando da Educanorte. “Nossa pesquisa precisa ser implicada”, defendeu logo de início o jovem acreano de 27 anos, da cidade de Cruzeiro do Sul. Para tal, trouxe dados de sua dissertação na UFAC, com capítulo de livro publicado na revista Debates da Educação. O pesquisador trouxe dados sobre o avanço da reforma do Ensino Médio desde 2016 e impactos na LDB e em seu estado. “O Acre é o segundo estado mais pobre do Brasil.” Segundo ele, com muitas divisas, existe ali a atuação de facções criminosas que arrastam a juventude. E quando estes jovens conseguem chegar à escola, falta até mesmo uma alimentação de mínima qualidade nutricional, baseada em biscoitos. Na parte pedagógica, a nova lógica imposta nos últimos anos tem agravado esse quadro. “Os estudantes estão na terceira série e só têm português, matemática e educação física. O resto todo é base diversificada, com 3 horas de orientação. Esse menino vive na vulnerabilidade social, com famílias desestruturadas, sem acesso à internet, pega transporte público lotado e eu tenho que dizer pra esse menino trabalhar o ‘autodidatismo’, tirando dele química, física, história, filosofia e outras disciplinas. Sou totalmente a favor da revogação. E os professores também têm consciência disso”, expôs Anderson.

Na sequência, Doriedson do Socorro Rodrigues (UFPA), pesquisador do GT 09 (Trabalho e Educação) da ANPEd, estruturou sua fala lembrando da importância de se considerar todas essas desigualdades sociais das Amazônias, defendendo, sobretudo, um Ensino Médio baseado na formação ampla e no fortalecimento da esfera pública para juventudes ribeirinhas, quilombolas, extrativistas, urbanas e tantas outras. “As pesquisas mostram que a juventude não está estudando porque está trabalhando, são vidas interditadas. Segundo ele, essas famílias, que sobrevivem com renda de meio salário mínimo, são privadas de todo tipo de acesso, do material e social ao cultural, com redução de carga horária de disciplinas. “Não dá pra resolver tudo isso só com questão curricular”, argumenta. O pesquisador também lembrou que, numa consulta inicial da ANPEd aos seus 23 grupos de trabalho, foram identificadas 156 publicações de relevância sobre o tema do Ensino Médio. “As pesquisas têm muito a dizer”.

No encerramento das apresentações, Silvia Cristina Conde Nogueira fez questão de afirmar que é uma cientista da Educação da Amazônia, formada na UFAM, onde atualmente é docente. Para ela, a proposta de reforma do Ensino Médio não atende minimamente ao direito de desenvolvimento do educando, de cidadania e preparo para o trabalho. Trazendo dados de pesquisa no estado, Nogueira expôs como a redução de carga horária, flexibilização de itinerários, com incerteza de componentes, além da atuação de grupos privados junto às secretarias, estão prejudicando as escolas. “Tem ocorrido uma redução da EaD ao whatsapp, com tempos escolares adaptados em curtos períodos. Qual projeto nacional estamos realmente pensando para as juventudes brasileiras?”, questionou.

A ANPEd realiza em no dia 02 de junho (Sudeste - UNIRIO) e 06 de junho (Centro-Oeste - UnB) os últimos dois seminários sobre Ensino Médio, trazendo subsídios à consulta pública realizada pelo MEC, que se encerra no dia 06 de junho.

Assista a transmissão do Seminário realizado em Manaus: