Entrevista com Maria Gontijo Castro (UFV) e Daniela Alves de Alves (UFV) |RBE n.70 | "Ensino, pesquisa e extensão na Universidade Federal de Viçosa: origem e trajetória institucional (1926–1988) "

O número 70 da Revista Brasileira de Educação já está disponível. Entre os artigos que integram esta edição, está o "Ensino, pesquisa e extensão na Universidade Federal de Viçosa: origem e trajetória institucional (1926–1988)", escrito por Maria Gontijo Castro (UFV) e Daniela Alves de Alves (UFV). O trabalho reflete sobre o sentido funcionalizado que orientou o modelo "ensino, pesquisa e extensão" que marca o projeto institucional de origem da UFV, inspirado no modelo dos land grant colleges, e o sentido social e político desse modelo para as universidades brasileiras, após sua consolidação na constituição de 1988.

Maria Gontijo Castro (UFV)

 

Qual é a relevância de se estudar a história de uma universidade e os atores políticos e econômicos que a construíram?

No âmbito da produção acadêmica sobre o ensino superior brasileiro, o autor Luiz Antônio Cunha destaca-se pelo uso da abordagem histórica e crítica sobre a constituição da universidade brasileira, desde o período imperial até a Reforma de 1968. As obras, Universidade Temporã, Universidade Crítica e Universidade Reformanda, publicadas ao longo da década de 1980, revelam que a relevância do estudo da história de uma universidade está exatamente em trazer elementos importantes para compreender as condições efetivas em que se deu a criação e desenvolvimento dessa instituição no país, entendida como instituição social, e como tal, imbricada nos contextos políticos, sociais e econômicos da sociedade como um todo.

 

Qual a importância da consolidação do ensino, pesquisa e extensão dentro da universidade?

Ensino, pesquisa e extensão são os pilares que legalmente qualificam a condição de universidade no país, conforme preconiza a Constituição Federal brasileira. No estudo realizado e, apoiadas no estudo feito por Mazzilli (1996), vimos que o princípio da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão advém de uma longa trajetória de gestação na sociedade brasileira tendo como pano de fundo o questionamento da função estritamente profissionalizante que marcava o ensino superior brasileiro desde sua origem. Desta forma, a consolidação das funções do ensino, pesquisa e extensão significa a consolidação da proposta de uma universidade brasileira histórica e criticamente engajada com a sociedade, dado que a conquista deste princípio envolveu a atuação de forças sociais, ao longo da história, que incorporaram um discurso em prol de uma universidade socialmente referenciada (MACIEL;MAZZILLI, 2010).

Daniela Alves de Alves (UFV)

 

No artigo é evidenciado como agências de fomento privadas influenciaram na modernização das universidades, mas também contribuíram para intensificar as desigualdades na distribuição de recursos entre pesquisadores de diferentes áreas de conhecimento. Qual o reflexo desse fomento hoje no ambiente acadêmico?

Um dos reflexos, que remonta desde a criação do Conselho Nacional de Pesquisa em 1951, é a desigualdade na distribuição dos recursos por área de conhecimento. Com mais ênfase no período militar, vimos que o financiamento de uma política de ciência e tecnologia para o país veio casado com o direcionamento da pesquisa nas universidades às demandas do desenvolvimento econômico, e assim privilegiando áreas de investigação tecnológica em detrimento de outras de pesquisa básica ou de pouca relação direta com os projetos de desenvolvimento do governo. Atualmente, vemos que além da desigualdade, no ambiente acadêmico, entre pesquisadores de diferentes áreas de conhecimento no que tange à distribuição de recursos, essa situação estimula a “funcionalização” da universidade a interesses privados, o que acaba por “operacionalizar” uma instituição que historicamente vem lutando para se manter autônoma e crítica. O ajuste fiscal que afeta e afetará as universidades pelos próximos 20 anos forçará a ampliação da parceria com as instituições privadas. De um lado a postura dos setores empresariais é de cobrarem prioritariamente por conhecimentos que possam render lucratividade a curto e médio prazo, por outro lado a aproximação entre os setores produtivos e a academia pode fomentar segmentos de pesquisa para os quais o recurso público não é suficente. O grande desafio é orientar a comunidade científica para os interesses e problemas dos diversos segmentos da sociedade brasileira sem, contudo, permitir o enfraquecimento do princípio da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão que tanto lutamos para conquistar.

 

Referências Citadas:                                                                          

MAZZILLI, S. Ensino, pesquisa e extensão: uma associação contraditória. 1996. 231f. Tese (Doutorado em Educação) − UFSCAR, São Carlos.

MACIEL, A. S.; MAZZILLI, S. Indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão: percursos de um princípio constitucional. In: REUNIÃO ANUAL DA ANPED, 33, 2010, Caxambu. Anais... Caxambu: ANPEd, 2010. Disponível em: <http://33reuniao.anped.org.br/tp33.htm#gt11>. Acesso em: 17 de jul. 2013.