Dia dos Professores? | colaboração de texto por Elvis Rezende Messias (GT 17) e Mariana Silva Mancilha

Elvis Rezende Messias1

Mariana Silva Mancilha2

No dia 15 de outubro comemora-se a “dia dos professores”, uma data marcante para considerarmos a importância desse profissional fundamental para o desenvolvimento humano e social. Porém, corremos o risco de fazer das chamadas “datas comemorativas” apenas um momento de romantismo e cinismo, ou seja, corremos o risco de nos lembrar da importância de algo somente nessas datas, valorizando-o com elogios exagerados e até caricatos, mas de nos esquecermos dele no restante do ano.

Os professores e as professoras desempenham um singular trabalho humanizador, auxiliando as pessoas no encontro com as potencialidades que trazem consigo mesmas, auxiliando no desenvolvimento de certas habilidades, mas também na capacidade de olhar crítico sobre a realidade e sobre si mesmas.

Especialmente no tempo de pandemia que estamos vivendo, professoras e professores estão envolvidos em desafios imensos, muitas vezes tendo que transformar suas casas em salas de aula, seguindo no trabalho de ter que desempenhar inúmeras funções. De uma hora para outra, tiveram que aprender novas formas de exercício da profissão, além de serem praticamente obrigados pelas suas instituições a desempenharem outras funções que não são típicas do seu fazer pedagógico. Muitos estão sendo expostos em vídeos sem que os seus direitos de uso de imagem sejam respeitados; tantos outros estão tendo que gravar aulas, editar essas mesmas aulas em programas complexos, levando um longo tempo para isso (considerando que um professor não teve formação para se transformar, de uma hora para outra, em um youtuber, em média, para preparar, gravar, editar e disponibilizar uma vídeo-aula de 30 minutos gastam-se aproximadamente 10 horas de trabalho – alguém reconhece isso?). Um outro grande desafio é a aquisição de instrumentos tecnológicos adequados para esse tipo de produção (a maioria esmagadora dos professores não recebeu um material sequer, tendo que investir do próprio bolso em instrumentos que já eram caros e que, com a pandemia, tiveram uma alta ainda maior de preços). No meio disso tudo, a educação ainda tem recursos congelados, tida como um bem de segunda e terceira importância. Sem contar que, em diversos lugares, os salários de professores estão sendo pagos parceladamente, atrasados, dando-se prioridade a outras áreas também importantes. Mas as contas assumidas não esperam e os juros vêm.

Infelizmente, para muitas pessoas parece que “está tudo bem com os professores”. Mas não está! Muitos estão se adoecendo com jornadas de trabalho que excedem em muito aquilo que é previsto em seus contratos laborais, muitas vezes sem comer direito, sem dormir direito, sem condições de descansar e desfrutar do necessário lazer, com o excesso de mensagens e cobranças que não cessam de chegar em suas redes sociais, muitas vezes pela madrugada, em fins de semana e/ou feriados (alguns foram verdadeiramente obrigados a ter que disponibilizar seus contatos pessoais para alunos, algo desrespeitoso, que afronta o direito à privacidade, pois as instituições e os governos não se preocuparam suficientemente em apresentar uma plataforma eficiente para o trabalho remoto de seus professores). Muitos precisam trabalhar em várias instituições de ensino para complementar suas rendas, com desgastes ainda maiores.

Entretanto, algumas luzes também aparecem, pois diversas pessoas (estudantes, pais, sociedade) estão tendo a oportunidade de reconhecer melhor a importância do trabalho humanizador das professoras e professores. Mas é preciso que cuidemos para não criarmos uma imagem do professor como um “super-herói”. O professor e a professora não querem ser vistos romanticamente como heróis, mas sim que sejam concretamente valorizados: estrutura decente para trabalhar, respeito social e político, respeito dos estudantes, colaboração coletiva de toda comunidade com o trabalho educacional, salários mais dignos (e pagos em dia)... A visão do professor e da professora como “heróis” tem servido de justificativa para manter suas situações de trabalho muito abaixo do que lhes é digno. Para piorar, ainda há uma onda ideológica que tem proliferado a ideia de que os professores são “perigosos”, gerando perseguições, vigilâncias e ameaças a muitos deles.

O “dia dos professores” tem servido para quê? Que importância essa importância tem? Mais que proliferarmos mensagens prontas de parabéns nas “datas comemorativas”, aproveitemos a oportunidade para refletirmos melhor sobre elas. O que se pretende com esse texto não é trazer uma visão “vitimista” e muito menos “romântica” do professor e sim trazer a possibilidade de um olhar crítico da realidade educacional: é importante “abrir as cortinas” e mostrar “os bastidores” de tudo que o professor tem vivido para desempenhar o seu trabalho com maestria. Reconheçamos que não se trata de um teatro.

Mas o leitor e a leitora devem estar se perguntando: “Diante dessa realidade tão difícil, então deve ser ruim demais ser professor, não é?”. Provavelmente a maioria dos professores responderá que não, pois, mesmo diante desse preço alto a ser pago, o amor pela docência, os instantes de olhares atentos dos estudantes e tantas outras belezas que são experimentadas no exercício da profissão fazem com os docentes se movam, se reinventem e se motivem ao melhor. Os professores são profetas da esperança, são pessoas que investem em sua “fé” no ser humano, em sua fé na vida... Mas isso precisa ser alimentado concretamente, historicamente, pela valorização “moral” sim, mas também “estrutural”, integralmente.

Por fim, não nos esqueçamos de que o “professor” não é um mero “papel social” a ser desempenhado, mas uma “pessoa humana”. Não haverá “dia do professor” enquanto todos os dias ainda não forem o “dia da dignidade integral da pessoa humana”. Pensemos, então, no humano, pensemos humanamente, e trabalhemos juntos para que condições humanas concretas se efetivem para o trabalho e a humanização de todos. Esses serão os melhores “parabéns” que poderemos oferecer.

1 Mestre em Educação pela UNIFAL. Especialista em Filosofia pelo CEUCLAR. Licenciado em Filosofia pela UEMG. Bacharelando em Teologia pela UCDB. Desenvolve pesquisa de doutoramento em Ciências da Religião. Professor-pesquisador da UEMG-Campanha.

2 Mestranda em Educação pela UNIFAL. Especialista em Gestão e Supervisão Escolar e licenciada em Pedagogia pela Faculdade Victor Hugo. Professora de Educação Básica da SEE/MG.