Mário Luiz Neves de Azevedo (UEM) | entrevista sobre nova metodologia de financiamento de PPGs pela Capes

Confira entrevista de Mário Luiz Neves de Azevedo (UEM), Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Estadual de Maringá, sobre nova metodologia de financiamento de PPGs pela Capes. O depoimento foi solicitado para reportagem da ANPEd sobre a mudança de regra da agência (leia aqui).

Mário Luiz Neves de Azevedo (foto de arquivo pessoal)

Qual o impacto previsto a partir da nova metodologia proposta pela Capes para financiamento dos programas?

A nova matriz de financiamento de custeio por intermédio do PROAP, baseada na mediana dos programas de todas as áreas no País, imediatamente, reduz drasticamente o repasse aos programas de pós-graduação com mais de 39 mestrandos e 41 doutorandos matriculados; aliás, com maior impacto para a grande área das Ciências Humanas, que foi desclassificada como prioridade na CAPES. Digo desclassificada porque se os programas passam a se dividir em prioridades 1 e 2, sendo só uma delas, as Ciências Humanas, chamada de prioridade 2, significa simplesmente que a formação e a pesquisa nesta área do conhecimento não fazem parte das prioridades eleitas pela CAPES. Na Educação, genericamente, pelo menos 9 entre 10 Programas de Pós-Graduação em Educação no Brasil estão situados em cortes superiores a estes números de matriculados e, segundo esta metodologia, receberão menos verbas do PROAP. Para o Programa de Pós-Graduação em Educação da UEM, a nova matriz implica em corte próximo de 60% em relação ao PROAP de 2014. Para a área de Ciências Humanas, Letras e Artes, segundo estudos do professor João Batista Carvalho Nunes (UECE), a nova matriz de financiamento reduz sua participação de 15% para 5% do PROAP, significando uma diminuição imediata a 1/3 do que recebia em 2014.

Ademais, em médio prazo, esta nova política de financiamento pode trazer impactos (esperados ou não) na oferta de vagas de mestrado e doutorado na área de Ciências Humanas, inclusive na educação, pois induz os programas a aproximarem o número de matriculados à mediana nacional (39 mestrandos e 41 doutorandos). Outro impacto negativo, em instituições que têm médios e grandes programas de pós-graduação, seria a secessão por linhas de linhas de pesquisa, isto é, internamente, estimula-se a divisão dos programas por linhas pesquisa, levando a perda de organicidade, da solidariedade e da interdisciplinaridade. Por fim, contrariando o PNE 2014-2024, especialmente a estratégia 4.16, que induz a inclusão dos profissionais da educação em cursos de pós-graduação, e a Meta 14, que prescreve “elevar gradualmente o número de matrículas na pós-graduação stricto sensu, de modo a atingir a titulação anual de sessenta mil mestres e vinte e cinco mil doutores”, esta nova matriz de financiamento prefere ser fiel aos mandamentos de determinados atores sociais que têm dominado o espaço de interseção entre os campos político e acadêmico, que conseguiram explicitar no Plano Nacional de Pós-Graduação - PNPG 2011-2020 componentes de hostilidade e de discriminação negativa em relação à área de Ciências Humanas. Vale citar: “o sistema deverá crescer na próxima década, pois além de ser relativamente pequeno e recente, não está saturado e poderá ser convocado para novos e importantes serviços, gerando a necessidade não apenas de crescer, mas de crescer com qualidade. O sistema continua formando um contingente expressivo de doutores nas chamadas Humanidades, que incluem as Ciências Humanas, as Ciências Sociais Aplicadas, as Letras e as Artes (cerca de 31% dos alunos matriculados em doutorado no ano de 2009)” (CAPES, 2010, p. 20).

Em síntese, a CAPES, com a nova matriz de financiamento para os programas de pós-graduação no Brasil, estabelecendo como método de distribuição de verbas de custeio a mediana dos programas e elegendo uma das áreas científicas como não prioritária (G2), está fazendo coro à tese da perversidade, conforme denúncia Albert Hirshman em seu clássico “Duzentos Anos de Retórica Reacionária”, em que conquistas sociais, neste caso de maior acesso à pós-graduação, são consideradas negativas.  O bom senso diria que esta ampliação do acesso processada na área de Ciências Humanas poderia ser replicada nas demais áreas e que, para isto, teriam apoio suplementar (prioridade) dos agentes públicos. Isto é, não se pode castigar um grupo, cortando o PROAP, por ter ampliado a oferta de um bem público necessário para o desenvolvimento integral do País (inclusive cultural) e que, por efeito, contribui para o cumprimento de uma das metas do PNE 2014-2024, justamente aquela que visa à democratização da pós-graduação.

Qual o contexto vivido especificamente por seu programa? Como ele pretende se reposicionar ou reagir diante de tal situação?

Percebo que, apesar de certa ataraxia inicial, a comunidade acadêmica, em especial a área de Ciências Humanas, está resistindo e procurando sensibilizar as demais áreas e a opinião pública. O PPE da UEM encaminhou o documento produzido pela ANPEd e FORPRED ao corpo docente credenciado, à Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação, à câmara de Pós-Graduação e Pesquisa da Universidade e ao Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes; solicitando que a matriz fosse pauta em reuniões da administração central e de seus colegiados. A proposta é continuar no caminho da mobilização, precisamos demonstrar que esta é uma política que dilacera a solidariedade entre as áreas científicas, solapa o cumprimento do PNE 2014-2024 e bloqueia criticamente a construção de um projeto substantivo de desenvolvimento do País.