José Gondra (UERJ) | depoimento sobre nova metodologia de financiamento de PPGs pela Capes

Confira o depoimento de José Gondra (UERJ), coordenador da FORPRED sobre nova metodologia de financiamento de PPGs pela Capes. O depoimento foi solicitado para reportagem da ANPEd sobre a mudança de regra da agência (leia aqui).

José Gondra

 

 

 

 

 

 

José Gondra (foto: João Marcos Veiga / ANPEd)

Inicialmente cabe lembrar que os programas de apoio à pós-graduação têm uma história associada à própria CAPES, criada em 1951, e que tem sido uma agência estratégica na expansão e consolidação da pós-graduação stricto sensu (mestrado e doutorado) em todos os estados da Federação.

As linhas de ação desta agência encontram-se organizadas em torno de 5 grandes eixos

  • avaliação da pós-graduação stricto sensu;
  • acesso e divulgação da produção científica;
  • investimentos na formação de recursos de alto nível no país e exterior;
  • promoção da cooperação científica internacional;
  • indução e fomento da formação inicial e continuada de professores para a educação básica nos formatos presencial e a distância.

Até 2014, observamos uma linha ascendente no financiamento e nos diversos programas consolidados e instituídos pela CAPES. Em 2015, contudo, houve um corte linear na parte do custeio da CAPES que impactou de modo severo dois programas vitais para manutenção e fortalecimento do sistema nacional de Pós-Graduação. Os cortes no Programa de Apoio à Pós-Graduação (PROAP) foram da ordem de 75% e no Programa Excelência Acadêmica (PROEX) em mais de 50%. As despesas de capital, por sua vez, foram totalmente eliminadas. No ambiente de restrição financeira e ajuste fiscal, a agência priorizou outras linhas de ação, conforme divulgado oficialmente pela diretoria da CAPES.

Em 2016, o apoio aos programas sofreu uma nova modificação. Para dar um exemplo do que ocorreu na recente medida adotada sobre o custeio dos programas de pós-graduação, vou me deter no caso do PROEX.

Até 2014, o valor concedido se baseava no valor do ano anterior, acrescido de ajuste de inflação e possíveis concessões adicionais, derivadas do orçamento não executado.

O valor de custeio do PROEX dependia de alguns fatores, tais como:

  • valor do PROAP, quando o PPG ainda não integrava o PROEX;
  • tamanho do PPG (número de alunos);
  • idade do PPG;
  • concessões adicionais ao longo dos anos;
  • porcentagem de utilização do custeio em bolsas.

Este ano, a metodologia adotada pela CAPES para a concessão do PROEX aos programas de pós-graduação 6 e 7, passou a considerar um “teto” baseado na mediana do quantitativo geral de alunos em cada nível (mestrado e doutorado) dos programas. Essa mediana é de 45 alunos no Mestrado e 70 alunos no Doutorado.

A área de educação possui 9 programas que integram o PROEX. Se a Capes definiu um valor mediano como “teto” para a concessão do PROEX, quantos PPGEs 6 e 7 atendem a mediana estabelecida? Essa resposta é um importante indicador para avaliar o prejuízo dessa medida no financiamento da área de Educação. O estudo realizado por João Nunes (UECE – vice-coordenador do FORPRED/ANPEd) mostra que somente um único programa (11,1% do total) não sofre com a adoção desse critério, enquanto os oito programas (88,9% do total) foram penalizados. Tomando como exemplo o programa que possui 305 alunos em nível de Mestrado Acadêmico, seu tamanho é 6,8 vezes o valor da mediana definido pela Capes. No caso do doutorado, tomando como exemplo o programa que possui 414 alunos, seu tamanho é 5,9 vezes o valor da mediana definido pela Capes.

Situações como esta merecem ser analisadas com muita atenção sob pena de se comprometer a qualidade e a continuidade dos programas da área de educação. Ao mudar a regra para o emprego da mediana, os resultados demonstram, portanto, que o critério de concessão do PROEX, tomando por base a mediana do quantitativo de alunos em todos os programas de pós-graduação de todas as áreas do conhecimento, é muito prejudicial à área de Educação, em virtude do tamanho do corpo discente nessa área.

Outro elemento definido pela CAPES, com impacto direto no funcionamento dos programas consiste na distinção das áreas em dois grandes grupos: G1[1] e G2[2]. Para se ter uma ideia, o custo do aluno do Mestrado no G1 foi calculado em R$550,00, já os do G2 corresponde a R$ 375,00, isto é, cerca de 32% abaixo. O caso do doutorado não é diferente: R$1.100,00 para os alunos do G1 e 750,00 para os do G2.

Se consideramos que os programas da área de educação foram estimulados a crescer de modo a atender ao que se encontra estabelecido no PNPG e PNE, um pós-graduando desta área se encontra duplamente penalizado, seja pela regra da mediana, seja pela distinção pouco compreensível entre alunos; os mais caros e outros mais baratos. Para se ter uma ideia, um programa com 473 alunos que, nesta regra, tenha recebido cerca de R$60.000,00 de custeio/ano; o custo de cada aluno equivale a R$126,84 para apoiar o aluno durante o ano inteiro. Já um programa do G1, dentro da mediana PROEX, com até 45 mestrando e 70 doutorandos receberia R$ 101.750,00. O custo do doutorando seria da ordem de R$ 1.100,00 e o do mestrando da ordem de R$ 550,00/ano. Com isto, pode-se notar a grande disparidade no financiamento da malha da pós-graduação e seus efeitos nefastos na manutenção dos programas, em especial, os da área de educação.

Considero que medidas com força indutora como esta devem ser revistas imediatamente, considerando a malha estruturada, o funcionamento efetivo dos programas e a contribuição dos mesmos na formação de quadros de alto nível, conhecimento novo e ciência de ponta. Qualquer medida que violente a autonomia das universidades e de seus programas deve ser problematizada, de modo a reconhecer a diversidade e os inúmeros desafios existentes para superar as condições nas quais se faz ciência no Brasil.

Como área, a educação deve estar profundamente solidária para enfrentar mais este golpe contra a pesquisa em educação, o ensino e a formação qualificada na área. Devemos aprofundar o debate entre nós, com a sociedade e demais poderes constituídos de modo a construir o entendimento de que a educação deve ser uma prioridade efetiva, traduzida no reconhecimento do campo e no financiamento continuado para a pesquisa e para os programas de pós-graduação em educação do Brasil, considerando suas trajetórias e particularidades.

 

[1] Ciências Agrárias, Ciências Biológicas, Ciências da Saúde, Ciências Exatas e da Terra e Multidisciplinar - Biotecnologia, Ciências Ambientais, Materiais, e Interdisciplinar (*Interdisciplinar G1: Meio Ambiente e Agrárias; Engenharia/Tecnologia/Gestão; Saúde e Biológicas.)

 

[2] Ciências Humanas, Ciências Sociais Aplicadas, Linguística, Letras e Artes, Multidisciplinar – Ensino e Interdisciplinar (Sociais e Humanidades).